segunda-feira, 2 de março de 2009

Quanto vale a vida?

O valor da minha vida é meu, da minha família... Mas, de fato, nossas vidas não valem nada. Ou valem uma mochila.

As pessoas dizem que dão valor a vida, mas não é verdade. Comem muita fritura, andam sozinhos à noite, dirigem rápido demais, bebem demais e não fazem exercícios físicos. Descem corredeiras e andam de montanha-russa.

Quando algo nos acontece, paramos para pensar no valor de nossas vidas.

Na madrugada de sábado o Marcos morreu ao reagir em um assalto. É triste. É clichê falar que os bons morrem cedo, mas ele era tão sossegado, não tinha ninguém pra falar mal dele (e olha que no meio em que nos conhecíamos, isso era uma grande proeza). Ele não merecia.
Não paro de pensar nisso e no quanto é frágil a vida, mas o que posso fazer? Beijar mais as pessoas que gosto, ficar mais com elas, blindar minha casa? Tentar pensar em tudo o que pode matar alguém e aconselhar todas as pessoas que gosto? Mas acho que nada resolve, a morte pode vir a qualquer momento e só Deus pode decidir o que e quando acontecerá.
Deus... Acredito tanto em Deus que não entendo como ele pode agir por intermédio de um bandido armado contra uma pessoa tão boa.

Eu entendo porque alguém rouba, pra ter dinheiro fácil. Mas por que matam? Matam alguém que nunca viu antes por ela se recusar a ser roubada. Será que ele está pensando nisso ou foi pra casa dormir? Será que ele se lembra do rosto do Marcos? Ele não fica pensando em como devia ser a vida daquela pessoa que ele matou? Que ele devia ter família, que a mãe dele deve estar chorando, que pela idade ele devia ser um ótimo estudante, da USP, que devia ter um monte de amigos, um monte de sonhos... Que ele era muito bom no photoshop e adorava Age of Empires (dava rush como ninguém ¬¬) e Campo Minado. Que era curioso e sabia tudo sobre algo no dia seguinte após ver alguém falar algo sobre isso (currahee).

Queria que ele voltasse para eu falar: “seu idiota, nunca viu um milhão de especialistas dizendo para não reagir? É revoltante, mas é só você que tinha o que perder, você perderia de qualquer jeito, a vida ou o dinheiro. Agora olha o que te aconteceu.” Mas ele não vai voltar... e todos ficarão para sempre pensando que deviam ter dito isso pra ele antes.

Não faz sentido.

http://www.baluzao.com/2009_03_01_archive.html

sexta-feira, 9 de janeiro de 2009

Gustavo Ioschpe para a Folha

A cobertura do conflito entre Israel e Hamas surpreende pela omissão de dois fatos simples e indispensáveis. Primeiro: Israel não ocupa Gaza desde 2005. Segundo: o Hamas é uma organização terrorista. Não são "milicianos", "radicais", "fundamentalistas". O que diferencia o Hamas é o uso de métodos terroristas para alcançar seus objetivos. Objetivos, aliás, públicos e antigos: constam de sua carta de fundação, de 1988, solenemente ignorada pela imprensa.

Em seu documento, o Hamas declara "trabalhar para impor a palavra de Alá sobre cada centímetro da Palestina" (art. 6º). Aqui, "Palestina" é a histórica: território que hoje inclui Israel, Gaza e Cisjordânia. Essa formulação prega a destruição de Israel e a criação de um Estado islâmico, governado pela sharia (a lei muçulmana).

No artigo 7º, o Hamas cita "o profeta [Maomé]: "o julgamento final não virá até que os muçulmanos lutem contra os judeus e os matem'". No artigo 11, declara que a Palestina é um "Waqf": terra sagrada e inalienável para os muçulmanos até o Dia da Ressurreição e que, pela origem religiosa, não pode, no todo ou em parte, ser negociada ou devolvida a ninguém.

Há outros trechos interessantes -o Hamas deixa claro o papel dos intelectuais e das escolas, que é de doutrinamento para a jihad; das mulheres ("fazedora de homens" e administração do lar) e até determina o que é arte islâmica ou pagã -que permitem ao leitor antever o paraíso de liberdade em que se tornaria a Palestina caso a sua visão fosse concretizada.

Também há artigos em que o antissemitismo do grupo acusa a comunidade judaica internacional de dominar a mídia e as finanças internacionais e de ter causado a Segunda Guerra Mundial, em que 6 milhões de judeus foram assassinados.

O documento flerta tanto com o ridículo que ele mesmo esclarece, no artigo 19, que "tudo isso é totalmente sério e não é piada, pois a nação comprometida com a jihad não conhece a jocosidade". Quanto à seriedade do Hamas, não resta a menor dúvida, e seria bom que a comunidade internacional deixasse de tratá-los como pobres coitados e os visse como o que são: genocidas que só não implementam sua visão por inabilidade.

A realidade no Oriente Médio mudou, mas a imprensa brasileira não se deu conta. Passou tanto tempo atacando Israel por sua ocupação contra os pobres palestinos que continuam a dirigir sua sanha acusatória três anos depois do fim da ocupação.

Qual é a justificativa do Hamas para disparar foguetes contra a população civil israelense? Nenhuma. Para alguns, seria uma reclamação contra o bloqueio da fronteira. Essa é uma maneira totalmente ilegítima e inaceitável de protestar. Para notar o absurdo, basta imaginar se o Uruguai resolvesse lançar foguetes sobre a Argentina quando esta bloqueou suas fronteiras por causa da "guerra das papeleiras".

Pode-se realmente exigir de Israel que abra suas fronteiras a uma organização que deseja destruí-lo? Por que o Egito também bloqueia sua fronteira com o Hamas (apesar de ninguém protestar por isso)? Será por que o grupo usa a fronteira para contrabandear armas?

Quaisquer que sejam as razões do Hamas para a campanha de pirotecnia -campanha assustadora, que já lançou mais de 3.500 foguetes contra Israel-, nenhum Estado pode tolerar essa agressão contra seus cidadãos.

Comentaristas sugerem a resolução do problema por vias pacíficas, mas ninguém menciona exatamente como se daria a negociação, já que o Hamas não reconhece a existência de Israel. Aqueles que reconhecem o direito de resposta de Israel o fazem com duas condicionantes: que a resposta seja proporcional ao ataque e que civis não sejam vitimados.

A exigência de proporcionalidade é uma sandice. Levada ao pé da letra, significa pedir que um Estado democrático constitucional lance foguetes a esmo contra uma população civil indefesa. Outra "saída" seria a morte de mais soldados israelenses. Ou, melhor ainda, civis. Ninguém menciona que, na Segunda Guerra, morreram 22 vezes mais civis alemães do que ingleses. O dado é ignorado com razão. A contabilidade é irrelevante. Hitler precisava ser derrotado.

É certo que a morte de qualquer civil é uma tragédia. Uma vida é uma vida. Mas, quando os acusadores se espantam que 20% ou 25% dos mortos sejam civis, eu me espanto pelo contrário: é preciso enorme controle e apreço pela vida de inocentes para que, em uma região densamente povoada e contra um inimigo que se esconde em regiões urbanas, o índice de acerto seja de 75% a 80%.

Os membros do Hamas se escondem em áreas residenciais, em prédios cheios de crianças. Agem de tal maneira que, em seu confronto com as democracias ocidentais, nós sempre saímos perdendo: ou pagamos com as vidas de nossos civis ou com um pouco da nossa civilidade.

Não há maneira militar de derrota-los em definitivo. A melhor saída é drenar o pântano: chegar a um Estado palestino com os moderados do Fatah e investir para que o atraso econômico e a sensação de derrota e humilhação de muitos países árabes sejam amenizados. Fazer com que o caminho da paz e da prosperidade seja mais atraente que o terrorismo.

Enquanto isso não acontece, é preciso mão forte para combater o terrorismo que já nos atinge. Ontem em Nova York, hoje em Gaza, amanhã provavelmente em outras capitais do mundo civilizado.